Não fui o autor intelectual do crime que esta corte julga ter sido consumado. Depois de muitas horas de depoimento e acusações, foram consideradas procedentes todas as provas levantadas. Não tive como apelar ou adiar a sessão para uma nova data como costumava ver no cinema. Na verdade, estava demasiado curioso por entender o porquê de estar naquele lugar. Antes não parecia um filme, depois começou a confundir o meu senso (diga-se passagem acostumado somente a ocasiões em que o ridículo fosse abominável). Cheguei a cogitar a volta de um coma num futuro onde a inteligência artificial houvesse abolido a maioria dos humanos, senão todos. Na bancada, vários conhecidos. Mal conseguia olhar para as testemunhas presentes. O advogado havia me orientado a falar apenas o extremamente necessário para não estragar sua estratégia de defesa. Ele próprio já tinha assumido o ethos do personagem cuja saída foi a de alegar insanidade mental. Em seu discurso, o réu era incapaz de estabelecer sinapses sadias em se tratando de sentimentos e emoções. E o clima do tribunal era pesadíssimo. Eu me sentia um monstro recentemente acometido por um surto hediondo. Segundo documento impresso da acusação, as conversas virtuais, que representavam o histórico criminoso, mostravam claramente as minhas inescrupulosas intenções. Eu não havia premeditado absolutamente nada que pudesse ameaçar a integridade sentimental dela. Quando dei por mim já estávamos de mãos dadas. O juiz entendeu a história como um desvio de conduta. Quase não argumentei, não poderia prever o acontecido. Isso não fazia parte dos planos.
4 de dez. de 2007
20 de nov. de 2007
Sílabas Eufóricas
19 de nov. de 2007
Perda de Contato
16 de nov. de 2007
Cem Olhos
10 de nov. de 2007
A Vida Tem Pressa
Negócios não têm alma. Alma não tem cor. É inútil tentar se enxergar esbugalhando os olhos no espelho do banheiro. Já me perdi inúmeras vezes tentando me encontrar. Em outras ocasiões contei os passos da ponte até aqui, chutando lata de refrigerante para pensar melhor o que falar caso perguntassem. Tornei-me adepto da ironia para confundir a quem poderia convencer. Notícias, esportes, entretenimento e vídeos, algumas inverdades absolutas estão notificando os meus sentidos. Dos presentes me esqueci, se o Papai Noel aparecer digam que fui atrás de uma água de côco com gás. Depois corro pra calçada, o lixo não pode se atrasar. Enquanto isso vão fazendo brinquedo pra ensinar logo cedo como é que se aprende a desaprender. Não me pergunte qual o meu cartão, minha identidade foi roubada. Roubaram o que eu seria. Chega mais perto pra sentir a loja do meu cheiro. Além de insensato, tenho uma sacola cheia de remédios baratos para curar os bons costumes. Nasci de um feitiço, depois o aprimorei. Hoje eu tento limpar o chão das estrelas com pano de algodão doce. Amanhã quem sabe eu pense
6 de nov. de 2007
Álbum Novo
Infinita tristeza eu poderia sentir se a caixa grande não parasse mais nos andares ímpares. A vida passaria a preto e branco num cair de pingo de chuva em noite de domingo aterrorizado pelos programas de TV. De um lado e do outro, ao avesso ou à vitrine, qualquer um saberia localizar a flecha. De fato, eu me sinto um alvo móvel, uma presa indefesa com codinome de desenho [des]animado. Preso pela força da fragilidade, irradiante nas horas vagas e assíduo nas noites de insônia. Ironicamente, roubo frases de caminhão para rechear de clichês o cotidiano. O fascínio pela megalomania reverbera pelos ares, serve apenas para acalentar sonhos. Quando se pensa grande, os ventos mais fortes sopram ao nosso favor para manter a proporção. A vida deve ser um roteiro inacabado(e muito mal pago, por sinal). Quando a gente se dá conta que é o protagonista, entende porque os coadjuvantes são tão importantes para o andar da estória. Não há ensaio ou corte, daí os erros. Então acordo num videoclipe com o fone de ouvido no máximo para não ouvir o falatório dentro do coletivo. Quem vê a cara de paisagem não sabe onde o pensamento está. Estou concentrado no presente, antigas fotos não mais existem. Cuido das novas como se fossem as últimas.
25 de out. de 2007
O Sonho
O barulho era tamanho que não conseguia distinguir minha própria voz naquele ambiente. De repente, lembro de gritar bem forte, o máximo alcançável, nem por isso obtinha sucesso. O sufoco forçava o corpo todo a se envolver, também a se debater contra a parede. Nem mesmo um leve instante de calmaria mudava a situação. De uma porta a outra não se ouvia um som que levasse incômodo ao resto da casa. Isso só vinha a somar desespero. Nenhuma pancada mais forte, nenhum alarde solicitando ajuda. Eu fazia um enorme esforço para entender o que se passava. No mínimo, queria saber a origem de tamanha força sobrenatural. Depois de um longo período de tortura, não acreditava mais sobreviver. Não tinha nada de filminho na cabeça. Simplesmente não conseguia pensar em nada, apenas
22 de out. de 2007
A Pílula do Prazer
A vaidade transparece menor abundância aos olhos externos. Por dentro, o corpo dá sinais de fadiga mental, não adianta exigir de si próprio o senso universal da apreciação. Mesmo o que está próximo da perfeição, ainda está bem longe de ser muito bom. Uma febril compaixão pelos elogios acompanha os sussurros mais imediatistas das salivas afoitas. Com isso, fatos inescrupulosos vão comovendo a humildade. Lembra bem uma daquelas mocinhas chorosas em frente à TV pelo seu grau de distração. Ficar na porta de entrada é só uma maneira de tentar se redimir. Usar roupa velha é só o símbolo-mor da busca pela simplicidade que, no fim das contas, não introduz garantia alguma. Deve ser coisa de gente firme e forte venerar sua filosofia do não-arrependimento. Quando dar o melhor de si não coincide com os resultados esperados, não há lamentação que resista a dar uma cuspidinha. Espero que um dia a vida moderna disponibilize elogios em cápsulas, porque em caso de abstinência, a farmácia mais próxima pode resolver o problema. A vaidade agradece.
16 de out. de 2007
Crise de Ansiedade
3 de out. de 2007
Narciso Se Contorcendo
Senti-me um cubano na Disney World, um iraniano enriquecido de urânio na Wall Street. Logo de cara eu tinha assumido o papel de obra-de-bienal com sua complexidade visual posta em questão pelos visitantes. Os olhos alçados pelo voto de pobreza espiritual procuravam como um radar o mau gosto, e os dentes, à mostra forçosamente, esticavam as faces para emplacar simpatia. Melhor assim e aproveitar a deixa para economizar no botox futuramente, senão eu dispenso. Os pedaços de pano e o chinelo já tinham sido reprovados no teste de compatibilidade antes do DNA ser colhido. Ora, estou sendo filmado e ninguém diz para eu sorrir? Eu não pretendo vencer na vida e ter a felicidade de um comercial de margarina para mostrar aos vizinhos que as coisas vão bem. Não mesmo! O cego enxerga a todos da mesma forma, mesmo sob a égide da deficiência. Já nós, amparados pelos saudáveis atributos físicos, limitamo-nos a enxergar o que está exatamente na carcaça. Pura carcaça. Eu não uso mais a velha camisa preta desbotada do Nirvana com o desenho do Kurt Cobain, nem mesmo o jeans rasgado e o all star com um vermelho de dar inveja ao Jack White. Porém, é como se as lembranças estivessem reescrevendo o senso de direção, vestindo as idéias e seguindo o velho rumo guiado pela venta.
17 de set. de 2007
Uma Estrada e Quatro Pés
13 de set. de 2007
Velhos Novos Tempos
Acordar cedo, ir pra eucaristia, gravar rezas, assistir à missa e perder a pelada era prejuízo demais para uma pobre alma de nove anos, já que o assunto era prioridade. Ainda hoje aprecio jogar pela rua. Ainda costumo comer as mesmas coisas que aprendi a gostar quando criança.
Só depois de ver o velho Nelson comentar foi que parei para prestar atenção. E não é mesmo! Se as crianças são livres e felizes mesmo sendo coagidas, imagine se o mundo lhes desse de presente boa parte da sabedoria logo a partir do primeiro berro? Meu pai, depois de analisar minuciosamente um dos primeiros exames, estava confiante. “Nossa, doutô, acho que meu filhinho vai nascer com uma baita duma lapa! Já vejo os amigos de faculdade o chamando de tripé”. Logo em seguida o ilustre corrige, “Que isso, meu caro! Isso aí que o senhor está vendo no ultrassom é só o cordão umbilical”.
9 de set. de 2007
Em Memória aos Detalhes
30 de ago. de 2007
Sobre Homens e Cães
16 de ago. de 2007
On/Off
11 de ago. de 2007
De Volta ao Ringue
Um homem só já é um equívoco para poluir um determinado ambiente, imagine vários deles conversando despreocupadamente numa calçada qualquer? Algumas lesadas mentes ainda se perdem, mas não me canso de comentar sobre nosso tamanho nível de “abestadice”. Não dominamos papo interessante algum. Elas simplesmente fingem interesse pelo que falamos, deixando-se levar por alguma espécie de atração cujo foco principal não é o nosso conteúdo, porque se dependêssemos de tal êxito para conseguirmos beijá-las, estaríamos tão longe de concretizarmos nosso desejo quanto um jumento de dominar dois idiomas. Depois daquela paquera bem sucedida, então voltamos para casa com a plena certeza que o sucesso foi obra da lábia, do pleno exercício da arte da conquista. Mal sabem nosso ego e inteligência que a prática milenar dessa tentativa expurgou aos tempos atuais uma espécie de lista de clichês de exaustivo uso masculino, transformando-nos num ser repetitivo e, em alguns casos, acéfalo. Não precisamos existir para uma determinada mulher, nem ocupar a sua agenda telefônica ou estar na sua lista de contatos online - todas sabem quem somos e o que rotineiramente falamos quando nossos olhares alardeiam perigo. E é óbvio que a nossa reduzida inteligência no domínio de qualquer que seja a estratégia permite facilmente a identificação de nossas reais intenções. Importuno mesmo deve ser quando estamos só olhando.